sexta-feira, setembro 10

Brasas

Sabem como é quando nos aproximamos da lareira e sentimos o calor, porém não conseguimos ver as brasas donde ele emana pois estão cobertas pelas cinzas.É assim que me sinto, é assim que me vejo...
Sabem, a música no ínicio até fazia sentido. Tinha paixão, tinha garra... era um som que fazia vibrar, despertava emoções. Fui redescobrindo aquele roncar que atordoava a mente, fui-lhe sentindo cada segundo, desmembrei-o em pedaços. Mesmo assim ainda fazia sentido, mesmo visto aos bocados. Depois, essa noção do que era surgiu... dúvidas tão pouco pertinentes, contudo o seu eco, no vazio do espírito, que afinal nada mais era que ar, o seu eco... era como se as dúvidas deixassem de o ser dando o seu espaço às certezas mais negras que alguém pudera imaginar.
Por esta altura, a música era um misto de ritmos, de sons confusos, era atabalhoada... duas verdades que se juntavam aos poucos em verdades opostas, contraditórias, mas certezas absolutas que se anulavam.
No final não restou nada (já dizia Pessoa, o resto é nada), o vazio. Uma triste melodia de fundo que adormece um lugar morto, que leva a vida mais preenchida a transformar-se numa eterna rotina em tons de cinzento.
Então vem-se escrever... descobre-se alguma coisa e a música deixou de ter sentido. É só mais um som.
Não sei bem a quem estou a escrever. Talvez a toda a gente, provavelmente a ninguém... simplesmente apeteceu-me. Feitas as contas posso dar como certas várias coisas. Uma delas - tu não me conheces - outra - nem tampouco eu me conheço. Apaixonei-me agora por um ideal, não por uma mulher. Nada sei dela, e isso agrada-me.
Posso assim imaginá-la vivendo numa casa de campo, bebendo café enquanto ouve ranger os taipais, vendo pela janela uma paisagem melancólica e molhada, algumas árvores desgrenhadas, ondulações de erva luzidia, barracões baixos, longínquos e cinzentos, e a chama enferrujada abandonada numa charneca vizinha. Imagino-a taciturna, a essa mulher ideal, fumando cigarros enrolados em papel de milho, que lhe amareleceu a ponta dos dedos. Imagino-a tropeçando nas palavras quando fala, como as pessoas demasiado cheias de palavras e de imagens. Espera, imagino-me tão somente a mim, no feminino...
De facto, há mais... a voz confunde-se na música, o som perfeito, a harmonia, o esplendor... as palavras... o fim. Sim, mas há mais, sempre existe algo mais... porque não há fim!!! É só acreditar que é para sempre. ACREDITEM ! ! !

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